terça-feira, 1 de maio de 2012

BARALHOS DE TRANSFORMAÇÃO

O século XIX oferece aos pesquisadores e colecionadores de cartas alguns baralhos a um só tempo atraentes e surpreendentes, nos quais os símbolos dos naipes se integram à ilustração de cada carta de uma maneira tão engenhosa quanto, com frequência, carregada de ironia ou de humor. Trata-se dos chamados "baralhos de transformação", de origem e significados que ainda permanecem pouco claros.
Segundo o professor Detlef Hoffman, é possível que a idéia tenha surgido de uma espécie de entretenimento praticado pelos ingleses no final do século XVIII, que consistia em fazer nas cartas de baralho os mais atrevidos desenhos. Outras teorias sustentam que a origem dos baralhos de transformação está nos desenhos que as crianças faziam nas cartas para divertir-se, ou mesmo em simples exercícios de estilo de alguns desenhistas ou pintores. Seja como for, o fato é que esses baralhos, fabricados tanto na Inglaterra como na Alemanha, na Polônia e nos Estados Unidos, chegaram a alcançar uma qualidade artística e uma criatividade extraordinária. Às vezes, os artistas tomavam certas liberdades ainda maiores, deslocando os símbolos das cartas para melhor adaptá-los a seus desenhos, ou incluindo nelas textos e jogos de palavras. Isso gerou discussões entre especialistas, já que alguns preferem considerar esses produtos como baralhos ilustrados, e não especificamente como baralhos de transformação.
Entre os autores desses curiosos baralhos, podem ser encontrados personagens tão inesperados como John Butler Yeats - pai do célebre peota irlandês William Butler Yeats - ou o escritor inglês William Makepiece Thackeray, autor dos romances Feira das vaidades e Barry Lyndon, entre outros. As 21 cartas transformadas de Thackeray foram publicadas postumamente por sua filha, que as inclui num livro em que reuniu diversos textos inéditos do escritor. Thackeray tinha a intenção de completar a "transformação" de todas as cartas do baralho, mas a morte prematura impediu-o de realizar a tarefa.
O baralho de transformação impresso mais antigo é atribuído ao alemão J. G. Cotta. Esse conjunto de cartas ficou conhecido pelo nome original de Die Spielkarten Almanache (O almanaque do jogo de cartas), pois ele era vendido junto com um calendário e um folheto explicativo. Dedicado a Joana d'Arc, o baralho de Cotta foi impresso em 1804 para ser distrbuído na época do Ano Novo de 1805. O mesmo fabricante produziria posteriormente outros cinco baralhos de transformação.
Os baralhos alemães tinham conteúdo mais sério do que os do grupo conhecido como Metastasis/Transformation Cards, fabricados na Inglaterra entre 1803 e 1812. Essas cartas, que não constituíam um baralho completo, foram desenhadas por John Nixon, considerado por alguns como o inventor das cartas de transformação. Seus desenhos originais foram copiados em repetidas ocasiões e muitos deles aparecem no primeiro baralho de transformação inglês completo, produzido por J. Fuller em 1811.
No caso dos Estados Unidos, o primeiro baralho de transformação, impresso por Charles Bartlett, de Nova York, data de 1833. Posteriormente apareceram o Samuel Hart Transformation Deck, da Samuel Hart & Company of New York and Philadelfia, em 1860, e as Eclipse Comic Playing Cards, de F. H. Lowerre, em 1876. Em 1879, C. E. Carryl desenhou um baralho para a empresa Tiffany's, de Nova York, conhecido como Harlequin Playing Cards. Também são importantes os baralhos de transformação fabricados nos Estados Unidos entre 1895 e 1896 pela United States Playing Card Company, entre os quais se destacam o Hustling Joe, o Hustling Joe II, o Vanity Fair e o Ye Witches' Fortune Cards.
Por essa época, o mundo começava a testemunhar o declínio dos baralhos de transformação, hoje conservados como uma curiosidade do século XIX e como valiosas peças de coleção, já que são muito difíceis de encontrar. Os artistas que no século XX desenharam cartas o fizeram de forma completa, incluídos os símbolos (como acontece com o famoso Tarô de Salvador Dalí). Com isso, pôs-se um fim no desenho sobre a própria carta, que é a base dos baralhos de transformação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário